sexta-feira, 2 de junho de 2017

Cachaça

O Decreto no. 4072, de 03 de janeiro de 2002, apresenta as seguintes definições
para aguardente de cana e cachaça:
   “Aguardente de cana é a bebida com graduação alcoólica de 38 a 54 oG.L., a 20°C, obtida de destilado alcoólico simples de cana de açúcar ou pela destilação do mosto fermentado de cana de açúcar, podendo se adicionada de açúcares até 6 g/L”
  “Cachaça é a denominação típica e exclusiva da aguardente de cana produzida no Brasil, com graduação alcoólica de 38 a 48 oG.L., a 20°C e com características sensoriais peculiares” (Brasil, 2002).
   A cadeia de produção de cachaça é constituída das etapas de produção
agrícola, processamento e comercialização. Durante a etapa de processamento ocorrem as operações de moagem, fermentação, destilação e embalagem, podendo também ocorrer o envelhecimento (Coutinho, 2003 ).
 Matéria-prima
   A matéria-prima para a fabricação da cachaça é a cana-de-açúcar. Outros ingredientes empregados como o fubá, o farelo de arroz ou a farinha de soja (esta última pouco usada em Minas Gerais) são incorporados ao caldo de cana como suplementos nutricionais para o fermento, podendo, portanto, ser classificados como aditivos ou coadjuvantes (OLIVEIRA, 1988, sitado por VILELA ,2005). A matéria-prima é fator primordial na qualidade do produto e produtividade da fábrica de cachaça e o produtor deve estar atento para a escolha de variedades de cana que melhor se adaptem às características do solo, período de safra e clima de sua região. As espécies de cana-de-açúcar utilizadas na produção de cachaça são inúmeras e atualmente   estão disponíveis muitas espécies resultantes de cruzamentos (MAIA et al., 1995,sitado por VILELA ,2005).       
 Os principais fatores de qualidade e produtividade da cana-de-açúcar são: local e ambiente de cultivo, pragas e doenças, variedade e planejamento agrícola. O planejamento está relacionado com os aspectos de maturação da cana, queima, colheita, carregamento e transporte (CTP, 1998, sitado por VILELA ,2005).
   Nos novos referenciais de qualidade da cachaça artesanal, o caldo da
cana de açúcar é a única matéria-prima aceita para o processamento da bebida. A convenção de qualidade estabelece que a cana deve ser cortada sem queimar os canaviais e moída num intervalo de tempo inferior a 24 horas. A prática de queimar os canaviais prejudica o meio ambiente e a qualidade da cachaça, pela inversão da sacarose (açúcar da cana) e pelas cinzas residuais, que interferem na operação de fermentação (FARIA, 1993).


                                                                                                                                                    Moagem da cana-de-açúcar
 Para a moagem a cana deve estar limpa, sem palhas, terras e outras impurezas que além de aumentar o volume a ser prensado pelo engenho, são fontes de contaminação do caldo e posteriormente do fermento, reduzindo a capacidade de fermentação e piorando a qualidade da cachaça (CPT, 1998,sitado por VILELA 2005).
Propagação do fermento
 Durante a fermentação, as leveduras atuam no caldo, transformando a
sacarose em álcool e outras substâncias químicas. A convenção de qualidade estabelece um rigoroso controle higiênico sanitário da operação que deve ser realizada num período de no máximo 36 horas. Conforme Ribeiro (1997), a dilatação do tempo de fermentação é indicativo de contaminação do caldo por microrganismos indesejáveis e comprometem a qualidade da cachaça. Concluída a fermentação, o produto resultante denomina-se vinho da cachaça, que é encaminhado para os destiladores. Segundo a Convenção de Qualidade, a cachaça artesanal deve ser destilada em alambiques de cobre (HARRISON, 1990).
Destilação  
 A operação de destilação é um processo termoquímico, pelo qual se separam as substâncias voláteis do vinho da cachaça (água, álcool etílico, aldeídos, ácido acético, gás carbônico) das não voláteis (células de leveduras, bactérias, sais minerais) Uma vez separadas, as substancias voláteis são condensadas por resfriamento, formando três frações: cachaça de cabeça, cachaça de coração e aguagem (também denominada de calda (HARRISON, 1990).
 A Convenção de Qualidade ressalta que apenas a cachaça de coração pode ser utilizada, recomendando o produtor desprezar a cachaça de cabeça e a aguagem, uma vez que essas frações apresentam substâncias nocivas a saúde do consumidor e as propriedades sensoriais da bebida. (MUTTON, 1992)
    Envelhecimento  
 A cachaça destilada deve “descansar” por aproximadamente três meses,
ocasião em que ocorrem importantes reações de oxidação, tornando a bebida mais suave. Por opção do produtor ou oportunidades de negócios, a cachaça também pode ser envelhecida, armazenada em barris de madeira. O tempo de envelhecimento é variável, podendo ser estabelecido pelo gosto do produtor, pela demanda de mercado ou pela capacidade de armazenamento da unidade produtiva. Boscolo (1996) recomenda que a cachaça seja envelhecida pelo tempo mínimo de dois anos.
 A cachaça recém destilada é de difícil degustação, apresentando sabor ardente e seco ( Faria, 1995). Para melhorar a sua qualidade sensorial, convém deixá-la envelhecer em recipientes de madeira. Segundo Boscolo e t al . (1995), a legislação brasileira não estipula um tempo mínimo de envelhecimento e considera envelhecida a aguardente que contiver um mínimo de 20% da bebida acondicionada em tonéis de madeira, sendo permitida a adição de caramelo para padronização de cor. Lima Neto e Franco (1994) afirmam que o envelhecimento é resultado de uma série de reações químicas e não confere à aguardente qualquer coloração, que se
deve à dissolução de substâncias químicas existentes na madeira dos tonéis onde a aguardente foi acondicionada ou devido à adição de substâncias químicas. O processo de envelhecimento ou maturação não é totalmente conhecido; além da perda de água e etanol por evaporação, ocorrem as seguintes reações ( Boscolo et al ., 1995):
 a) oxidação e esterificação: são reações de álcoois e aldeídos com oxigênio e entre álcoois e ácidos produzindo ésteres (Boscolo et al ., 1995).
álcool + O 2 → aldeído
aldeído + O 2 → ácido
álcool + ácido → éster
 b) extração, decomposição, oxidação e esterificação da lignina da madeira: em contato com o etanol, a lignina da madeira forma um complexo etanollignina que se degrada nos álcoois coniferílico e o sinápico. Estes álcoois são oxidados produzindo aldeídos, ácidos e ésteres, que atribuirão aroma, sabor e cor à bebida. Polifenóis também são formados na degradação da lignina (Isique e Franco, 2000).


álcool coniferílico + O 2 → coniferaldeído + O 2 → vanilina + O 2 → ácido vanílico


álcool sinápico + O 2 → sinapaldeído + O 2 → siringaldeído + O 2 → ácido siríngico
 c) eliminação de compostos contendo enxofre: tióis e mercaptanas presentes em pequena concentração são eliminados devido à sua elevada volatilidade(Boscolo et al ., 1995).
PRINCIPAIS CONTAMINANTES TÓXICOS CACHAÇAS
 Segundo Novaes (1997 e 2000), tanto a cachaça obtida artesanalmente como a industrial podem apresentar problemas: o uso de água de baixa qualidade na produção, a queima da cana antes da colheita, a contaminação do caldo de cana por hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (benzênicos) cancerígenos oriundos do contato com o óleo lubrificante das moendas, o uso de reagentes que não tenham grau alimentício e outros. Suas considerações sobre a melhoria na produção da bebida no país reconhecem o valor do conhecimento tradicional associado ao conhecimento científico. A bidestilação da cachaça é considerada adequada por diminuir a concentração de compostos tóxicos, mas apresenta a desvantagem de elevar o preço final do produto. Deve-se também evitar o armazenamento da
aguardente no interior de tanques revestidos com produtos derivados do petróleo (como o asfalto), substituindo os por revestimentos neutros como o aço inoxidável.
 Lima Neto e Franco (1994) chamam a atenção para os problemas de saúde pública e da área comercial relacionados com a produção da cachaça no Brasil,considerando que cerca de 40% da aguardente ingerida no país não é  legalmente comercializada. A produção de cachaça envolve uma planta de produção química, sendo necessária a assessoria de profissional qualificado em Química para o acompanhamento e controle da produção, especialmente nas pequenas unidades e naquelas que operam clandestinamente.
PROCEDIMENTOS TÉCNICOS DE OBTENÇÃO DE CACHAÇA ARTESANAL DE QUALIDADE
 A assepsia compreende todos os cuidados higiênicos que procuram afastar os microrganismos, principalmente os patogênicos e deterioradores da matéria prima, dos equipamentos e demais utensílios que entram em contato com o produto Oliveira (2005).
 Por fim, uma cachaça de qualidade deve ter embalagem compatível ao
mercado que se destina. É tendência no setor o desenvolvimento de embalagens sofisticadas, objetivando atender as exigências do mercado de bebidas de qualidade(Coutinho, 2003 ).
 Submetida a uma Legislação, a atividade de produção de aguardente também é regulamentada por leis bem específicas para o setor (Oliveira 2005).